domingo, 30 de maio de 2010

Ponte das Taiadas



Passando pela ponte nova, o Piauinauta obteve esse efeito espacial de colocar o mirante entre o sol e a terra. Na edição passada chamei de estias e depois de estaias. Segundo uma gentil leitora e corretora não é certo estiada mas estaiada, que vem dos estaios, os cabos de aço que sustentam a ponte. Fosse no meu tempo e a gente já chamava de taiada, que é cada taio do cuscús ou do jerimum. Não parece?

A Culpa é do Macaco

Edmar Oliveira
.

Leio nas folhas de ciência que foi isolado o DNA do homem de Neandertal e, ao contrário do que se supunha, muito de nossos gens são comuns. Até ainda agorinha a gente sabia que vivemos lado a lado, que eles se extinguiram por serem inferiores, e nós, Homo sapiens sapien, fomos a espécie diferenciada dos macacos que nos erguemos, temos um polegar opositor que nos possibilita o uso de ferramentas e, como mostrou Stanley Kubrick no filme 2001, nos possibilitou agredir o semelhante na porrada com armas fabricadas. Mas até a nossa agressividade era fruto da evolução de uma espécie pura e inteligente que deixou os macacos pra trás.

Pois bem, os cientistas agora provam que o Homem de Neandertal não foi extinto e vive, para surpresa dos puristas, dentro de nós. Os homens da ciência afirmam que nós transamos com os macacos inferiores ao longo de nossa comum existência e criamos uma raça híbrida e não na pureza desejada quando tivemos que aceitar que viemos do macaco e não de Eva e Adão (sem o cacófago, senão piora). É, o bicho ta solto dentro de nós, para o bem ou para o mal.

Eu, cá com meus botões, sempre suspeitei da nossa parte macaca, principalmente das nossas elites políticas de Brasília que pulam de partido em partido, como de galho em galho anterior, e da nossa intolerância que rosna e bate no peito frente a uma briga de trânsito qualquer, por exemplo.

Isso pode, por outro lado, aliviar um pouco nossas culpas. Somos assim não por causa de Freud. A culpa é do macaco...

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na foto um Homem de Naendertal coloca seus gens numa Mulher Sapiens. Ou é o contrário?

Tua

Ana Cecília Salis

Meu corpo...
nú e frio
ferido...
e úmido...
exausto...
falido
um sopro renascido
e ainda vivo,

espera por tua pele...

DAS COISAS QUE NÃO SE ESQUECEM 2


Cinéas Santos

Na remota década de 60, todos os dias, no final da tarde, uma cambada de moleques entanguidos plantava-se à porta da casa de dona Purcina, no bairro Aldeia, à espera da ração de bola. Éramos quase todos do mesmo tope e todos da mesma cor: marrom-descaso. Integravam a cabroeira: Cleto, Valdemar, Paredão, Tonico, Berto, Zé do Jaburu, Orlando da Bela, Nivaldo, Walter do Candinho, Pedro e Solimar. Eventualmente, apareciam no terreiro: Marcelo Castro e Antônio Macedo, os dois únicos bem-nascidos do bando. Os outros éramos xerém. À época, bola era produto raro e caro. Muitas vezes, disputamos rachas animadíssimos com prosaicas bexigas de boi ou bolinhas de meia. No dia em que comprei minha primeira bola de borracha, uma autêntica “casco-de-peba”, não consegui me concentrar na aula: meu pensamente não se desgrudava dela. Parafraseando Bandeira, aquela bolinha foi minha primeira amante. E como o porquinho-da-índia do Poeta, ela não fazia o menor caso dos meus acenos e carinhos: preferia os chutes certeiros de Paredão e Solimar, o que me deixava roído de ciúmes...

Perdidos naquela aldeia remota, onde o rádio era um luxo só permitido a dois ou três ricaços, tínhamos uma verdadeira veneração pelo único time que conhecíamos: o do Pelé. Qualquer um de nós sabia de cor e salteado a escalação daquela máquina de destroçar adversários: Gilmar, Mauro, Dalmo, Lima, Zito, Melgálvio, Calvet, Dorval, Coutinho, Pelé e Pepe. À época, o time da Vila não tinha o menor pejo em pegar quatro gols numa partida; Pelé, Coutinho e Pepe, faziam cinco ou seis, dependendo do humor de cada um. Houve um dia, porém (14 de novembro de 63), em que o Milan cruzou o caminho do Santos para tirar-lhe o título de bi-campeão Interclubes. Para desbancar a equipe da Vila, o time italiano contava com a cumplicidade e a competência de dois brasileiros: Mazola e Amarildo, também conhecido como “o possesso”. Para os mais jovens, um lembrete: Amarildo fora o substituto de Pelé na copa de 62 da qual saiu consagrado. Era um centroavante rompedor e perigoso. Não bastasse isso, o Santos, naquele dia, não podia contar com Pelé, Zito e Calvet. 130 mil torcedores, no Maracanã, assistiram, consternados, a um primeiro tempo em que o Santos levou dois gols e não fez nenhum. Nos mais antigos, bateu a síndrome de macaranaço, medo de que se repetisse ali o que ocorrera em 1950, quando perdemos a copa do mundo para o Uruguai. Ledo engano. Se os italianos tinham um “possesso”, o Santos tinha um “alucinado”, Almir Pernambuquinho que, literalmente, comandou a reação e a virada sensacional. Vencemos por 4X2. Um dia para não ser esquecido.

Por que me lembrei disso agora? É escusado explicar. Com a mesma angústia vivida há 47 anos, vi o time dos “Meninos da Vila”, com três jogadores a menos, segurar a fúria do Santo André, na tarde do dia 2 de maio. Neymar, Robinho e Ganso fizeram a diferença. Finda a peleja, só me faltou a companhia dos moleques da minha aldeia, notadamente do Paredão, para que a alegria fosse completa. Um dia para ser lembrado, mesmo por um flamenguista juramentado como eu.

poemicro 7

EU TESEU

Me perco em teu labirinto
Mas nunca esqueço o que sinto

(Climério Ferreira)

FUTUCANDO O PLANETA COM VARA CURTA



Edmar Oliveira
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Futucaram tanto o planeta que conseguiram uma sangria desatada. Um poço de petróleo, no golfo do México, usando a mesma tecnologia empregada em todo os mares, inclusive pela Petrobrás e suas concessionárias ao largo de nossa costa, deu problema: uma plataforma pegou fogo, o ducto condutor do petróleo quebrou, uma válvula não funcionou como devia, e aí se derramou óleo do fundo do oceano enlameando as águas no maior desastre ecológico dos santos dos últimos dias. O derrame é contínuo, com a possibilidade de piorar, conforme o remendo empregado.

Esse susto foi só para que pudéssemos imaginar o perigo que corremos todos os dias de mais uma plataforma, entre milhares, naufragar, o cano quebrar e a válvula não funcionar em conter o derrame lá nas profundezas inatingíveis do oceano. É como se a seringa soltasse da agulha e o sangue da terra invadisse os mares sem que pudéssemos mergulhar para estancar a sangria. E o petróleo de nada nos serve a não ser matar a vida marinha, das aves e do costado marítimo da terra. Os americanos, vítimas primeiras desta vez, já consideram o prejuízo incalculável e Obama quer proibir esse tipo de exploração até que se consiga prevenir um acidente desses. Ainda não se sabe se falha mecânica (da tecnologia milionária empregada) ou humana (sempre vai se ter alguém em quem jogar a culpa).

Portanto que fiquemos alertas para a tão decantada exploração do pré-sal, onde a mesma tecnologia ao ir mais profundo tem tudo para aumentar a taxa de risco para a saúde do planeta. Não cansado dos desmatamentos, das queimadas, dos pastos ou do plantio da monocultura, que são apenas formas de atacar as florestas do planeta, acidentes desses nos mares podem apressar a inviabilidade da vida na terra. Tão futucando o bicho com vara curta...

VERSOS


Geraldo Borges


.


Poesia não é apenas palavra


Muito menos só sentimento


Pode ser também a larva


Um carnegão que arrebento.


.


Poesia por que não prosa


Água do rio na enxurrada


Ou mesmo ver qualquer coisa


Como não ver quase nada.


.


Poesia silêncio aflito


Estrela extinta no chão


Mosca dourada no gueto.


.


Poesia nome proscrito


Atenda a minha oração


E me perdoe o soneto.

Igrejas e Avenidas


Das Dores guardo pra sempre
São Benedito dentro de mim
Nossa Senhora seja Amparo
Que eu serei Frei Serafim




(Paulo Tabatinga)

"Receba as Flores que lhe Dei"


Mestre Cinéas, inteiramente recuperado de uma cirurgia na "coisa que só homem tem", recebeu flores, mandou essa foto para Joca Oeiras, gentil anjo andarilho de Oeiras, e agradeceu a preocupação do paulista de Oeiras com com este e-mail:

Joca, meu prezado:
Felizes os que recebem flores em vida. Obrigado pelo carinho. Velho Ancião

Nem único nem primeiro;
apenas um
filho da terra, o jardineiro.

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Já que o Piauinauta invadiu a confidência dos dois, mais um e-mail do Joca foi interceptado no espaço sideral:

Querido Professor Cineas:

Fiz de sua belíssima foto, aquela alcatifada de flores amarelas, papel de parede do meu computador. Sei que haverá gente que fará disso motivo de chacota mas não ligo a mínima. Toda vez que olho para ela, começando com o fundo bucólico, passando pelo colo florido e chegando à expressão enigmática do seu rosto – dura, embora enternecedora; quase alegre, mas portadora de uma tristeza, eu diria, ontológica; bastante reveladora, até mesmo no seu afã de esconder: mansa, embora talhada em armadura – me faz um bem danado saber que participo dessa mesma humanidade.

Beijos e abraços
Do Joca Oeiras, o anjo andarilho

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Bem meninos, a velhice enternece ou aboiola?
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Como o Piauinauta tinha entendido mal numa postagem anterior, Joca me corrige com este e-mail:

Querido Edmar

Gostaria imensamente de ter sido o autor do envio das flores amarelas ao professor Cineas; ao contrário o presenteado fui eu com aquela bela foto que não me canso de gostar. Peço, portanto, a bem da verdade, que desfaça o mal-entendido. No mais, parabéns para o autor do piauinauta. A propósito: a velhice enternece até mesmo os boiolas de carteirinha.

Beijos a abraços

Do Joca Oeiras, o anjo andarilho

PS Aguardo providências quanto ao equívoco

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Com pedidos de desculpa do erro ao Joca. Acho que a tempo... espero que a emenda não fique pior que o soneto...

A MULHER QUE CHORA

Luís Horácio

Tanto a lenda quanto a parábola costumam ser subestimadas, relegadas ao universo infantil na maioria das vezes, sem compromisso com a realidade. Operam no terreno da fantasia, do absurdo, nada além. Infelizmente vigora essa idéia. No entanto um autor chinês, Su Tong, ao reescrever uma lenda cria uma parábola que permite reflexões acerca do amor, do poder,do individualismo, da resistência...

Su Tong em A mulher que chora recria a milenar lenda de Binu. Na história original as lágrimas de uma mulher fazem desmoronar a Grande Muralha, o otimismo vence a tristeza. O mesmo não acontece em A mulher que chora , tristeza, dor, humilhação e uma pitada do absurdo de Kafka, dão o tom a narrativa de Su Tong. Binu, a protagonista da história, vive na Aldeia do Pêssego, lugar onde as mulheres são proibidas de chorar. Até hoje, os aldeões do sopé da montanha do Norte não se atrevem a derramar uma lágrima por causa da dor da morte. O marido de Binu, Qiliang , de repente desaparece, mais tarda ela descobre que fora recrutado para trabalhar na construção da Grande Muralha da China. O tal canteiro de obras não é o que se poderia chamar de lugar tranqüilo com boas condições de trabalho. A construção teria consumido número em torno dos duzentos e cinqüenta mil homens.

Pois foi para esse lugar que levaram Qiliang, o marido de Binu. A mulher assustada com os rigores do inverno que se aproxima, resolve levar roupas apropriadas ao marido que trabalha no trecho batizado de montanha da Grande Andorinha. A montanha dista mil li , segundo fui informado isso quer dizer milhares de quilômetros, da Aldeia do Pêssego, e Binu parte carregando uma trouxa na cabeça. Se eu tiver um cavalo, irei a cavalo.Se tiver um jumento,irei montada nele. Se não tiver nenhum dos dois, irei a pé.Um animal é capaz de percorrer essa distância. Nós não somos superiores aos animais? Quem disse que eu não posso andar mil li?

Convém estar preparado, sensível leitor, pois assim que Binu parte a história se enche de honra, piedade, sentimentalismo, fé, idealismo desmedido e obsessão. São valores eternos, você pode argumentar, erudito leitor, mas todos na mesma taça torna a bebida um tanto ácida em demasia.

A seguir, um exemplo. O recrutamento para trabalhar na construção da Grande Muralha trazia implícito o passaporte para a eternidade. Fugir era impossível, um carroceiro conseguiu.

Binu encontrou o tal carroceiro e ao perceber que lhe faltavam as mãos...

O carroceiro exibiu demoradamente os cotos sem mãos, primeiro o esquerdo, depois o direito. “Por que tanto interesse nisto aqui? Está pensando em se casar comigo?” Riu, ameaçador. “Quem cortou? Adivinhe. Vou lhe dizer uma coisa, pode tentar até o fim dos tempos, mas nunca vai adivinhar.Eu mesmo fiz isso comigo para evitar que me levassem para a montanha da Grande Andorinha! Primeiro cortei a mão esquerda, mas o convocador disse que não ter a mão esquerda não fazia diferença, já que eu ainda podia carregar pedras com a direita.Então pedi ajuda a meu pai para cortar a direita.

São personagens perdidos entre a miséria, a opressão, a fome, toda sorte de desgraça, perdem a guerra da sobrevivência para eles mesmos, sufocam a liberdade em seu interior.

A viagem de Binu é farta em sofrimentos, Su Tong divide em estações a narrativa, a medida que avança, narrativa e caminhada, os requintes de humilhação a que a mulher é submetida vão se sucedendo, enquanto isso o narrador deixa o leitor com suspeitas de um certo sadismo, também em crescimento.

Binu tem um papel na trama, sofrer. Sofre sozinha. Não encontra a menor solidariedade ao longo das 249 páginas de A mulher que chora.

É justamente o choro que permitirá a Binu um certo alívio de seu sofrimento. Às mulheres da Aldeia do Pêssego não é permitido chorar pelos olhos, aprenderam a chorar pelos pés, seios, cabelos, mãos. Suas lágrimas não são lágrimas quaisquer, são poderosas, capazes de curar doenças e mexer com a natureza.

Binu não pára, não descansa, decidida a levar as roupas de lã ao marido, não dá importância aos avisos acerca da estupidez de tal empreitada. É sabido que o conformismo impede mudanças, mas determinados exageros no concerne ao movimento, a atividade, ao idealismo, chegam a beirar o grotesco. Os personagens de A mulher que chora respiram os ares do absurdo e da verdade. Paradoxal? Nem tanto. Quer ver?

Os operários são recrutados sem explicações, sabem que trabalharão na construção da Muralha, não sabem ao certo onde nem as razões para tal construção. Muitos morrerão. Não resistem, não podem fazê-lo. Uma mulher resiste. Resiste chorando. Muda algo? Minimamente sim.

Com potente lupa o leitor perceberá uma amostra da mediocridade humana, das condições sociais e políticas da China daquela época, e das atrocidades que o poder costuma perpetrar independente do cenário.

No frigir dos ovos Su Tong trabalhou no limite entre a dor e a tragédia, e no entender deste aprendiz o limite já é excesso.

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O autor Su Tong, o mesmo de Lanternas Vermelhas (1991), que virou filme, nasceu em Suzhou, na China, em 1963, e vive em Beijing. Escreveu sete romances e mais de duzentos contos. Teve obras traduzidas para o inglês, o francês, o alemão e o italiano. Em 2009, venceu o Man Asian Literary Prize, a versão asiática do Booker Prize, com o livro O barco para a redenção.

Adão Mão-de-Vaca

Adão estava perambulando triste pelo jardim do Éden, muito sozinho, quando Deus perguntou:
- O que há de errado com você?
Adão disse que não tinha com quem conversar e era muito solitário...
Deus disse-lhe que então iria lhe fazer uma companhia e que seria uma
mulher. Disse mais:

- Ela será muito bonita, recolherá alimento para você; irácozinhar para você, e quando você sujar suas vestimentas, elalavará para você. Concordará sempre com cada decisão que você tomar e não o enganará. Será sempre a primeira a admitir que está errada quando vocês tiverem um desentendimento. Elogiará e o apoiará sempre. Carregarásuas crianças, e nunca pedirá que você se levante no meio da noite para cuidar delas. Nunca terá uma enxaqueca e sempre terá vontade e disposição para lhe dar amor e carinhosempre que você necessitar.
Adão então perguntou a Deus:

- Quanto me custará essa mulher?

Deus respondeu:

- Um braço e uma perna!

Adão, pensou por um momento e então, falou:

- Senhor, o que posso conseguir por uma costela?

Naturalmente, o resto da história você conhece...

olha o que dá ser mão-de-vaca !!!!!!!
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garimpado por Carlos Augusto

poemicro 8

*LAVOISIER *



Na poesia nada se perde, tudo se transforma

Embora não se ganhe um só tostão



(*Climério Ferreira*)

O CÁLICE DE KAFKA



Paulo José Cunha



Não fui convidado.

Apenas acordei aqui,


o cálice entre as mãos,


e, ao meu lado,


a ampulheta partida.



Nem sei a hora

em que a orquestra tocará


o último acorde.





Apenas permaneço,


expectante.


E já nem quero


que me apareça


alguém de vestido diáfano


e olhos de cristal.




(Já me daria por satisfeito


se pelo menos me explicassem


porque riem tanto)



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desenho: Amaral

e-mail para a redação

Caro Edmar Oliveira,


Gostaria de homenageá-lo como poeta, no Sarau Ágora.


Se for possível, marque um mês, a partir de Julho.


O sarau acontece sempre na última quinta de cada mês, e já estamos na trigésima primeira edição.



Estou te enviando, para postar no blog, se possível, um poema meu e de um amigo conterrâneo: Rogério Freitas



NEFELIBATA


A Rogério Freitas




Mitomania no bojo do peito


medíocre, maluco, maldito guerreiro


divaga nos bares, vagueia nos ares


de nefelibata, vencedor vencido



A perda nem sempre carreia a derrota


o ganho nem sempre conduz à vitória


a vida é um palco cheio de ventura


à altura de homens de olhos abertos



João Carvalho




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GIRA MUNDO




O dia vem vindo - contemplo daqui


O sol que dos montes me surge luzente


Mal surge tão rubro transforma o espaço


Um pássaro ao longe me canta dolente



O dia vem vindo - da minha janela


E eu vejo o começo da vida agitada


Os homens dominam, os carros dominam


O meio da rua, também a calçada;



A aragem amena se extingue com o sol


É grande o bulício; já não mais contemplo.


Os homens não lutam aqui pela vida


Somente desejam erguer o seu templo,



Esquecem com a pressa seus próprios irmãos


Nas mãos a ganância, só raiva e rancor


Com o mundo girando, na busca incessante,


Quem pode ao menos falar de amor?



Meu peito, que sofre dos males da vida,


Espaço não acha no mundo egoísta


Valores que tenho me foram negados


Apenas os tenho pagando analista



Rogério Freitas


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Grande poeta de Oeiras João Carvalho,

estarei em Teresina de 3 a 5 de junho para o SALIPI. Mas já adianto: sou poeta ruim e bisexto... (Edmar)

Bicicletas Inter-Estaduais



achado na internet essa movimentação de bicicletas entre Timon Teresina. Garimpado por Paulo Tabatinga.

domingo, 16 de maio de 2010

O Piauinauta na Ponte Estiada




Na primeira foto pode ser vista a nave espacial do Piauinauta sobrevoando a nova Ponte Estiada da Teresina futurista e na segunda foto, a partir do interior do mirante da Ponte, o fotógrafo flagrou o Piauinauta já fora da nave flutuando sobre a cidade...

o Aeroporto de Teresina


Edmar Oliveira

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Eu adoro o aeroporto de Teresina. Tenho viajado muito por força do meu trabalho e dá pra fazer uma comparação de aeroportos, onde tenho ficado mais tempo do que dentro das aeronaves. E para certas cidades do nordeste (nesse quesito Teresina é primeiro lugar) você não faz um vôo como antigamente em que conexão (quando tinha) era coisa de minutos. Fica esperando o avião passar, como em ponto de ônibus. Falando nisso, aeroporto tá muito parecido com rodoviária. Na confusão e na sujeira. E os aeroportos, no mundo todo, foram feitos quais shopping center: você não sabe a hora nem onde está. E eles ficam te mandando pelos alto-falantes "devido o novo posicionamento da aeronave" pra tudo quanto é portão de embarque, menos o que está escrito na papeleta de embarque. Como tem aqueles túneis separando você da aeronave, você não sabe nunca pra onde está indo. O tempo de espera é infinitamente aumentado pelo tempo de stress. Eles lhe enganam o tempo todo. Às vezes você é chamado para embarcar quando a aeronave nem aterrisou. Por isso você vai ser deslocado, “devido o novo posicionamento, etc.” Situação vexatória em todo lugar. Menos em Teresina.

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Na terrinha o aeroporto é das antigas, sem túneis e passarelas, que não se precisa. No máximo seis vôos ao dia, raro é o momento em que há duas aeronaves no pátio. Ali a situação de embarque e espera é muito simples. Mas as autoridades cismam de manter o padrão dos grandes aeroportos. E você é chamado para embarcar antes do avião descer. Só que todo mundo ta vendo o pátio e se não tem avião algum chegado não vai sair nenhum, nem que seja a última chamada do autofalante, daquela voz macia de Íris Letieri (onde andará a voz dos aeroportos?). Portanto não há stress. Pode-se ficar no bar, no segundo andar, tomando uma bebida pra relaxar e ignorar as chamadas eletrônicas com ping boing! Você escuta o bicho chegar, ver ele atracar no pátio sem sair de sua mesa, assiste o pessoal descer, as trocas de bagagens e quando tiver gente entrando (os estressados que esperam hora e meia na sala de embarque do portão A – e só tem um portão!), você paga a conta e sai devagar em tempo de embarcar na aeronave. Né um sossego só? Por isso eu gosto do Aeroporto de Teresina e sou contra sua modernização precipitada.

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a foto lá em cima foi feita do meu celular enquanto saboreava uma cerveja gelada no bar do aeroporto. Veja como tudo fica a mostra: as bagagens, o abastecimento, o desembarque. Reparando bem, parece até que o bicho tá amarrado no pé de carnaúba que se ergue no pátio...

Gervásio


O Aeroporto de Teresina na ilustração de Gervásio Costa para o Piauinauta

Graça Vilhena e H. Dobal





CAMPO MAIOR




(H. Dobal)







Ai campos do verde plano
todo alagado de carnaúbas.
Ai plano dos tabuleiros
tão transformados tão de repente
num vasto verde num plano
campo de flores e de babugem.







Ai rios breves preparados
de noite e nuvem. Ai rios breves
amanhecidos ns várzea longa,
cabeças d’água do Surubim
no chão parado dos animais,
no chão das vacas e das ovelhas.







Ai campos de criar. Fazendas
de minha avó onde outrora
havia banhos de leite. Ai lendas
tramadas pelo inverno. Ai latifúndios.



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CAMPOS PASSADOS


(Graça Vilhena)



(para o poeta H. Dobal)


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campos de verde engano

terra alagada de desejos

onde pastava a inquietação



campos de verdes tempos

falso silêncio de carnaubeiras

leques de harém na mão do vento

ai, meninas, ai, bastardos

gritos de dor que se perderam

na vastidão dos latifúndios





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Graça lembrando quando mostrou seus versos ao grande poeta, já velho e doente: "Ele gostou e disse-me que estava muito bom. Fiquei muito feliz por ele ter gostado e entendido para que me serviu, no poema, seus "campos do verde plano".

Os Netos do Vaqueiro














Geraldo Borges


Ouvindo a fala de piauienses ilustres que deram a sua contribuição para a história do Piauí, o historiador Manuel Domingos Neto fez uma reflexão profunda sobre o fenômeno sócio político chamado coronelismo, velha categoria sociológica que esclarece a razão da pobreza do NORDESTE devido a exploração e dominação dos proprietários de terra, os donos de gado e gente. Mais ou menos isso, com outras implicações.

Manuel põe em cheque o tal discurso acadêmico do coronelismo; seu livro estribado em vasta documentação traça um grande mural da história do Piauí, a saga bravia dos vaqueiros, e põe em duvida o tão propalado absenteísmo. Na verdade, os vaqueiros com os seus cavalos, seus currais, suas boiadas foram as vigas mestras da construção da sociedade piauiense, e depois os seus netos.

Desde o inicio quando as fazendas serviam de suporte mecânico e alimentar para o serviço do Engenho de Açúcar das Capitania de Pernambuco e Bahia, nota-se logo o papel das terras piauiense ainda não definidas geograficamente para pastagem do gado, devido a inclinação de seus vales férteis.

Manuel traça toda a história economica e social do Piauí a partir das sesmarias, capitania, regime provincial até chegar a republica, a revolução de Trinta, desembocando na década de cinqüenta; claro que seu estudo extrapola a cronologia. Mas, cada época teve suas oportunidades de melhorias e fracassos. Manuel vai descrevendo tudo com a força de sua exposição, numa linguagem, embora acadêmica, mas, com estilo próprio, repleta de enxertos primorosos de nossa literatura poética, o que delicia mais ainda a leitura do seu texto.

Notei uma particularidade, terna, de sua parte, ao se lembrar quando menino da visita de um de seus personagens: Pedro Freitas a seu avô, em Parnaíba (pg 39). Esta evocação simpática de Manuel Domingo é apenas um digressão a parte aos meus comentários, e o fiz para .evidenciar a emoção do autor no ato de escrever, sem, tão pouco, perder o rigor de sua analise, virtude característica do autor, que tive ocasião de presenciar algumas vezes.

Enfim O QUE OS NETOS DOS VAQUEIROS ME CONTARAM esta sintetizado neste parágrafo, pagina 103.

“ Na analise das relações entre o domínio político local e o atraso econômico do país, mais producente que ressaltar a falta de visão, o servilismo ou a inoperância de governantes estaduais impotentes para determinar as orientações do Estado brasileiro seria enfatizar o lado deletério do modernidade brasileira.”.

Eis aqui um dos eixos principais de todo o trabalho de Manuel Domingo, o que ele pretende demonstrar na busca pela modernidade nordestina, com foco no Piauí. A sua nova versão sociológica da história do Piauí, é mais do que uma reflexão; é também uma ruminação que os bisonhos historiadores piauienses terão de engolir. Para ser sincero eu já degluti e gostei do sabor do texto. E também passo de agora em frente a ruminar o seu livro, esta nova pedra de toque nos caminhos e veredas do sertão piauiense.

mesmo...

Ana Cecília Salis




Não te procures mais em mim.
Teu contorno,
Perdeu o meu brilho.

Ó quão dessemelhante!


Paulo fez a foto da ponte nova modernosa (Ponte Estaiada, é isso mesmo?) com o contraste das casas humildes do Morro do Urubu...