Reparo que as pessoas vão desaprender a lidar com a palavra
manuscrita. Fora o curto período do uso dessa escrita nos primeiros anos
escolares, logo há uma “evolução” para a escrita no computador. Também essa
escrita de computador foi deslocada da sua antecessora, a escrita da máquina de
escrever. O computador permite uma escrita “cata milho” bastante rápida e
ninguém vai lembrar porque as letras do teclado são dispostas dessa forma
embaralhada.
A disposição das letras no teclado foi herdada da antiga
máquina de escrever mecânica e correspondia a maior uso das letras na língua
inglesa e a um distanciamentos entre as pás mecânicas para evitar que uma pá
trepasse em outras e travasse a máquina. Também caducou o curso de datilografia
que nos ensinava a lidar com o teclado das antigas máquinas de escrever.
Pois bem, agora o texto é digital. Todas as outras formas de
escrita foram sepultadas desde a popularização da escrita digital, coroada na propagação
dos Smartphones. Hoje um simples número de telefone ou uma receita culinária é
anotada diretamente em linguagem digital, aposentando definitivamente a caneta
e o papel.
Por outro lado, a difusão desta linguagem digital ajuda a
modificar sobremaneira o idioma escrito. Verbos novos como deletar são
incorporados, preponderantemente, anulando o verbo apagar. Abreviações e
imitações onomatopeicas tornam essa linguagem comum das redes sociais
indecifrável para os mais velhos. Ainda mais quando caras e símbolos,
conhecidos como ícones “emotions”, aparecem para significar tristeza, alegria,
felicidade, saudade e outros sentimentos emocionais, que são escritos agora com
a linguagem das cavernas pré-históricas neste futuro apressado. Verdadeiras
frases são construídas com estas carinhas e desenhos popularizados nas redes
sociais.
E, às vezes, essa linguagem vem muito antes da escrita
manuscrita. Laura, minha neta de pouco mais de um ano já sabe apertar tela de
Smartphone para interagir com essa escrita digital. Não sei se vai precisar ela
apreender a escrever com a mão. Mas que eu vou tentar ensinar esse traço da
nossa pré-história, isso vou.
Adirley Queirós foi jogador de futebol, estudou cinema na
UNB e faz filmes. Branco sai, preto fica
é um soco no estômago dado com precisão, enquanto ele conta uma história de
ficção científica que consegue transmitir metáforas demolidoras a partir de um
documentário. Mistura documentário com ficção científica. Que diabos de cinema
é esse? Cinema amador com baixíssimos custos de produção, que nos remete às
experiências com super-8 da década de 1970? Ou uma ousadia cinematográfica que
transforma sobreviventes de uma chacina policial da década de 1980 em
excelentes atores, apesar das mutilações decorrentes daquela chacina?
Pois bem, o cadeirante Marquinhos da Tropa e o amputado
Shockito são os principais atores deste filme que conta a chacina num baile funk
da Ceilândia, ocorrida em 1986. Marquinho está perfeito e fez jus ao prêmio de
melhor ator no festival de Brasília. O também ótimo Dilmar Durães é um viajante
do tempo, cuja nave espacial é um container que balança na areia vermelha do
planalto central e o piscar de luzes faz o “truque” da viagem no cinema.
Esse viajante tem a missão de colher provas para que o
Estado brasileiro seja responsabilizado pelo massacre que a polícia executou no
baile no passado. Por outro lado os sobreviventes do massacre estão fazendo uma
bomba para explodir Brasília. Ah, Brasília é governada por fundamentalistas
cristãos e tem uma polícia de “ação social” que separa os pobres da periferia
da capital federal. A polícia submete a Ceilândia a blitz frequentes e solicita
que as crianças saiam das ruas. E para o morador da periferia entrar em
Brasília é necessário um passaporte que é exigido nos postos de controle. Algo
tão real! A ficção é que é o documentário?
Enquanto o locutor de uma rádio clandestina – o personagem
de Marquinhos – faz um solitário programa noturno e o Shockito conserta
próteses para outros “companheiros de infortúnio”, a história do massacre que
aconteceu é contada com os mínimos detalhes e de como ela marcou a vida dos
moradores reais de uma Ceilândia feia, abandonada, triste, cheia de grades e
terra vermelha, com esgotos a céu aberto. O DJ Jamaica faz um fabricador de
bombas em trocas de passaportes para entrar em Brasília. E eles recolhem os
forrós da periferia, os sons da feira de Ceilândia, a cultura pobre da
periferia para rechear a bomba que explodirá sobre Brasília. E Brasília, tão
perto da Ceilândia, não aparece no filme. O metrô às vezes é uma viagem no
tempo, mas Brasília é inacessível.
Senti pena de o filme ser tão precário tecnicamente por não
poder ver uma explosão fantástica de Brasília e delirei com multidões apavoradas
tentando tapar os ouvidos invadidos pelos sons da periferia. Estas cenas “desejantes”
não existem no filme, mas acho que Adirley as fariam com mais recursos.
Ou quem sabe ele só quer que nós sejamos capazes de imaginar
o que acontecerá se não houver tempo. Talvez a reparação das culpas do Estado
pelo abandono que faz às populações periféricas não venha a tempo de evitar a
explosão da revolta. Branco sai, pretofica pode significar também a
explosão da vingança. E se um cineasta me faz imaginar tanto, ele faz o melhor
cinema. Apesar das deficiências técnicas, Adirley faz cinema do bom.
Sentido horário: Mistral, Astúrias, Neruda, Gabo, Paz e Llosa
(Geraldo Borges)
Prêmios literários não
classificam nem desclassificam os seus detentores, nem, muito manos, as suas
obras. Não seja por isso. Mesmo assim ouçamos o que nos diz Pablo Neruda, um
ganhador do premio Nobel.
“A
verdade é que todo o escritor deste planeta chamado terra quer alcançar alguma
vez o prêmio Nobel, inclusive os que não o dizem e também os que o negam.”
Conheço mais ou menos a história
do Premio Nobel e espero ate hoje um escritor brasileiro ganhar esse prêmio.
Está difícil. Mas, em compensação, a lista dos premiados hispano-americanos é
razoável. O espanhol é mais conhecido que a língua portuguesa.
“A última flor do Lácio, inculta e bela. És a um tempo esplendor e
sepultura. Amo-te assim, desconhecida e obscura.”
Do tempo de Olavo Bilac para cá
não mudou muito não. Não obstante o Itamaraty e os consulados brasileiros pelo
mundo afora, muita gente pensa que falamos espanhol.
Com mais de um século de vida o Premio Nobel
premiou apenas um escritor da língua portuguesa, - Saramago, um comunista
histórico. No momento em que os comunistas não metem mais medo em ninguém.
O primeiro escritor latino
americano que ganhou o Prêmio Nobel da Literatura, 1945, chama-se Gabriela Mistral,
grande poeta. Também foi professora primária. A sua celebre página - Oração da
Mestra - é um hino que ainda ecoa em nossos dias. Ouçamos.
“Senhor! Tu que ensinaste, perdoa que eu ensine e que tenha o nome de
mestra, que tiveste na terra. Dá-me o amor exclusivo de minha escola; que mesmo
a ânsia da beleza não seja capaz de roubar-lhe a minha ternura de todos os
instantes. – Mestre faze perdurável em mim o entusiasmo e passageiro o
desencanto.”
Pouco mais de vinte anos depois
eis que surge um novo escritor Miguel Ángel Astúrias, da Guatemala, autor do
romance O Senhor Presidente. Ouçamos o
que diz dele Gabriela Mistral.
“E uma obra fenomenal que focaliza numa linguagem incisiva, poética,
realista, a tirania na América; sem a menor dúvida uma das narrações mais
fortes, mais cruas, mais impressionantes já publicadas em qualquer idioma.”
O idioma espanhol mais uma vez
está de parabéns, e a literatura barroca
abrindo caminho para o realismo mágico.
Não se passaram quatro anos lá
vem Pablo Neruda, 1971, de novo um Chileno, grande poeta e prosador. Ouçamos o
que ele diz aqui a respeito de seu irmão Garcia Lorca.
“Não sou político nem jamais participei da na contenda política, e
minhas palavras, que muitos teriam
desejado neutras, estiveram tingidas de paixão. Compreendei-me e compreendei
que nós, os poetas da América espanhola e os poetas da Espanha, nunca
esqueceremos nem perdoaremos o assassinato de quem consideramos o maior dentre
nós, o anjo deste momento da nossa
língua. E perdoai-me o fato de que de todas as dores da Espanha só vos
recorde a vida e a morte de um poeta. E que nós não podemos nunca esquecer este
crime, nem perdoá-lo. Não o esqueceremos, nem
o perdoaremos nunca. Nunca”.
Uma década mais tarde o realismo
mágico abre caminho para Gabriel Garcia Marques, 1982. Quem não se recorda de
Cem anos de solidão? Foi então quando começamos a dar mais importância aos escritores
hispano-americanos. Consideramo-nos os melhores. Como disse Paulo Mendes
Campos:
“Era indício de mau
gosto ou birutice gostar dos sul-americanos, a não ser de Pablo Neruda.”
Só queríamos saber dos europeus.
Em menos de dez anos depois,
1990, Otavio Paz, poeta e prosador mexicano empalma o Premio Nobel. Há muito
tempo que vinha perseguindo-o. Nós
continuamos na espreita. Em compensação no futebol, somos penta campeão.
Por enquanto temos ainda um
premado, 2010. Vargas Llosa, Peruano.
Carlinhos de Oliveira
Quem sabe o próximo não será
brasileiro. Se bem que na crônica de ficção brasileira encontrei um personagem
detentor do premio Nobel. Trata-se de uma crônica de nome: Autobiografia, na
qual o escritor José Carlos de Oliveira diz: “Já detentor do Prêmio Nobel, o controvertido escritor brasileiro fixou residência em Londres, cidade que ama
como a nenhuma outra, e se declarou
acometido de terríveis duvidas
de caráter religioso.”
O nosso consolo é que pelo menos
na imaginação somos detentores do Prêmio Nobel.
A lendária vocalista de jazz Billie Holiday nasceu com o nome de Eleanora Fagan Tosse em Baltimore em 7 de abril de 1915, de uma mãe nova e de um pai que abandonou a família logo após o nascimento. Depois de estuprada aos 10 anos, Billie foi abandonada pela mãe, indo viver com parentes distantes.
Para se sustentar ficou fazendo pequenos serviços e esfregando o chão de um bordel foi que ela ouviu jazz pela primeira vez, foram gravações ruins de Louis Armstrong e Bessie Smith no fonógrafo de casa. Com a idade de 12 anos Billie se mudou para New York onde se tornou uma prostituta. Em 1930, Billie convenceu um dono de boate para que a deixasse cantar numa noite, com o nome de Billie Holiday, em homenagem ao astro de cinema Billie Dove.
Depois de ser descoberta por John Hammond, Billie foi apresentada a Benny Goodman que a ajudou na primeira sessão de gravação em 1933; durante os próximos 11 anos Billie gravou mais de 200 músicas de jazz e swing.
No final dos anos 30, Billie se apresentava com Count Basie, Artie Shaw e outros, mas não gostava de atuar em orquestras por várias razões. Entre 1939 e 1945 Billie lançou vários sucessos, entre eles, "Fine and Mellow", "God Bless the Child", "Lover Man" e o anti-racista "Strange Fruit".
Porém em meados de 40, Billie era viciada em heroína; apesar de tudo ela continuou trabalhando bastante para se tornar um dos melhores cantores de jazz dos Estados Unidos. Com sua marca registrada, gardênias brancas no seus cabelos, "Lady Day" construiu uma reputação formidável como vocalista, capaz de cativar as audiências com o seu fraseado incomum, apesar da falta de um treinamento formal.
Enquanto Billie era reconhecida como uma artista brilhante, a sua vida pessoal era um desastre sempre crescente. Ela se casou e divorciou três vezes durante os anos quarenta, sofrendo freqüentemente abuso por parte dos maridos. Embora com seus concertos ganhassem uma boa renda, Billie não obtinha vantagens das gravadoras, que nunca lhe pagavam qualquer royalties.
Depois de anos de vício, Billie foi presa e encarcerada sob acusação de droga em 1947, fazendo com que mudassea sua carreira. Ela começou a excursionar pela Europa, onde era mais popular que nunca, mas em 1956 ela estava presa pela segunda vez e entrou em programa de reabilitação. Embora ela lutasse terminar com o abuso que a droga e o alcool lhe faziam, Billie morreu prematuramente em 17 de julho de 1959.
Apesar de morrer muito cedo, ela permanece como um das mais populares cantoras de jazz de todos os tempos. Em 1972 a dura vida de Billie foi revelada no filme "The Lady sings the Blues" sendo interpretada por Diana Ross.
Estou muito transtornado com esta páscoa ensanguentada. Trabalho numa comunidade vizinha ao Alemão. São todas parecidas, Alemão, Jacarezinho, Manguinhos. São habitadas por pobres, negros e nordestinos. E a polícia não respeita estes habitantes. Os direitos humanos dos quais se falam no asfalto não existe naqueles lugares. A polícia trata a todos como se fossem traficantes, bandidos. É sentida em cada fala o medo da polícia, que os tratam como se fossem inimigos. Há pouco tempo, na comunidade em que trabalho um adolescente foi morto pela polícia à queima roupa. Recentemente um menino já mortalmente baleado respondia ao policial porque estava correndo (a corrida foi o motivo do tiro):
- Estava brincando, senhor!
A brincadeira de pique-esconde foi a causa da morte daquela criança. Que ainda gravou com o seu smartphone a própria agonia enquanto morria.
- Estava brincando, senhor!
Mesmo morrendo ainda respeitava aquela autoridade, que deveria proteger sua inocente brincadeira, mas que a interpretou como o inimigo em fuga. E mesmo fugindo foi alvejado, isto é, de forma covarde e não recomendada nos manuais militares. Qual a culpa daquela criança? Espero que este policial ouça sempre na sua consciência o eco daquela voz pedindo desculpa por estar morrendo.
- Estava brincando, senhor!
Agora, na páscoa, numa sexta feira que deveria ser santa, uma criança de apenas dez anos encontrou a morte num tiro de um fuzil de uma guerra que não era sua. Eduardo era um excelente aluno. Era a esperança de redenção da sina daquela família que veio do Piauí em busca de vida melhor. O pai um migrante nordestino, como também sou. Também do Piauí. Com trajetória de migração semelhante a dos seus pais, Eduardo podia ser meu filho.
Mas eu moro no asfalto, quase em frente à residência oficial do governador. Uma viatura policial está na frente do meu prédio 24 horas por dia. Eu faço parte da sociedade, na qual essa democracia grega coloca a polícia para minha proteção e a me tratar bem. O pai de Eduardo, o meu conterrâneo, não tem essa mesma proteção. A polícia acha que se Eduardo crescer será um criminoso. Eduardo estudava, era um excelente aluno, e a mãe estava fazendo uma economia para matriculá-lo num curso de inglês, que ele tanto queria.
A comunidade do alemão agitou panos brancos nas janelas querendo paz nessa páscoa ensanguentada. E sonhando em poder gritar para a polícia parar de atirar.
- Eles estão só brincando, senhor!
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Esta crônica foi publicada no dia de Páscoa nas redes sociais. Aqui republicada em respeito aos leitores que ainda se recusam a cair nessas redes. Tem os que ainda estão no tempo do e-mail. Consigo chamá-los para o blog. Depois do whatsapp, do messenger e outros aplicativos de visão imediata os e-mails ficaram obsoletos. Mas respeito os que não se fazem acompanhar dessa liquidez dos tempos modernos.
As veias da América Latina estarão sempre abertas a sua Memória
Morreu Eduardo Galeano. Além do clássico, libelo anti-colonial, bibliografia de referência em qualquer curso de Ciências Humanas, "As Veias Abertas da América Latina", Galeano tinha um lado pouco conhecido,mas com a mesma combatividade crítica e elegante: era um apaixonado por futebol e seu livro 'Futebol ao Sol a à Sombra" em que traça pequenos perfis de grandes craques da história do futebol é outro libelo contra a mercadorização do mundo da bola sob controle da Fifa. (Antônio Máximo)
Briga de Foice (Manassés de Sousa) Manassés de Sousa - viola de 12 // Luis Miguel - baixo fretless Mingo Araújo - zabumba, surdo, pandeiro, timbales, talking drum, lâmina de aço, triângulo, caxixis, frame drum, crash e vozes Vídeo de Carlinhos Nascimento
O desocupado às vezes se enche de inutilidades ou de
problemas que não deviam lhe chamar a atenção. Estava vendo um programa de TV
sobre a relação entre os cientistas da computação e os hackers, seus
concorrentes na ilegalidade.
Os primeiros montam os segredos para dificultar a invasão
dos segredos que os computadores possuem. Os segundos, tentado violar esses
segredos. Os hackers quase sempre ganham, o que faz a ciência da computação
evoluir mais ainda.
Tomemos um problema simples: a criptografia alfa numérica da
maioria de nossas senhas banais. Isso já está sendo desvendado pelos hackers
com facilidade. Os dados de nossa conta bancária, ou a simples senha dos nossos
e-mails já são violados facilmente com a criptografia que estamos usando no
momento.
Mesmo as impressões digitais ou o reconhecimento de nossa
íris, já implantados em alguns computadores bancários, podem ser desvendados
pela ação dos hackers, segundo o programa de TV que estava vendo. Portando os
cientistas da computação já estão estudando outras formas de criptografar
nossas senhas.
Uma delas está sendo conhecida por criptografia quântica. Na
física quântica um objeto pode estar em alguns lugares diferentes ao mesmo
tempo. Se eles conseguem trocar a criptografia digital entre o zero e o um,
como acontece no comportamento das partículas quânticas, os hackers não vão
saber distinguir entre o zero e o um trocando de lugar o tempo todo. Não me
perguntem como eles fazem isso porque eu jamais saberia explicar. Mas que é
interessante, é.
Mais maluca é uma segunda tentativa chamada de “computação ultra
paranoica”. Nessa o computador capta o movimento de como digitamos nos botões.
Os cientistas malucos descobriram que cada um de nós tem uma forma peculiar de
digitar senhas, executar notas musicais, ou fazer um texto no teclado do
computador. Esse modo padrão é interno e nós não nos damos conta de que ele
existe. Portanto, as senhas do futuro nem vai precisar que nós saibamos delas.
O computador vai interpretar o “jeitão” de cada um digitar um teclado.
Isso mesmo que vocês estão pensando. Na “computação ultra
paranoica” nem nós saberemos a senha que teremos. Se o cientista não for
internado, os hackers vão ter um
trabalho dos diabos para violar os segredos de um computador tornado esquizofrênico...
Ontem em me encontrei com Oscar Wilde em uma esquina de
minha cidade. Perguntei o que ele estava fazendo por essas bandas. Reconheci
que era Oscar Wilde, por causa de seu traje típico, aquele que a gente vê dentro
das brochuras de seus livros. Ele me disse que tinha fugido da prisão de
Reading. Notei que estava com um livro debaixo do braço, Era o De Profundis e a
Balada do Cárcere de Reading.
Oscar Wilde estava pálido, e não parecia mais aquele homem
tão conversador e elegante que animava os salões literários de Londres. Não foi fácil acreditar que estava conversando com o
próprio escritor irlandês. A maioria dos
escritores da língua inglesa é de origem
irlandesa. Para me garantir que estava
conversando com Oscar Wilde lhe perguntei se ele conhecia o conto: o rouxinol e
a rosa.
Yes. Yes, fui eu que
o escrevi.
Falei-lhe, então que o rouxinol e a rosa foi um dos
primeiros contos que me deslumbrou na minha adolescência, que o seu enredo é
doloroso, deixa a gente muito triste. Aí comecei a lhe recitar o começo do conto.
Ela disse que dançaria comigo se eu lhe levasse uma rosa
vermelha, mas não há nem uma rosa vermelha no meu jardim. O rouxinol ouvindo
esta historia começou a cantar toda a
noite com um espinho cravado no coração
até que lhe surgiu do peito ensanguentado uma rosa vermelha. O estudante
levou-a para a moça, ela não quis
mais. Já tinha outro pretendente.
O estudante jogou a sua flor na lama. Uma carroça, que vinha
na mesma direção, passou por cima.
Oscar Wilde sorriu, amargurado, tirou a sua flor da lapela e
me ofereceu. Aceitei-a. Ai ele me perguntou se eu conheci o Retrato de Dorian
Gray. Disse que sim. E que o seu enredo me impressionou muito. E que considero
o seu romance uma das obras primas da literatura ocidental. Mas a sua obra que mais mexe comigo é De Profundis e a Balada do Cárcere de Reading
que me parecem completamente diferente
do plano do resto de sua obra.
Sim. Sim. Foi feito num novo período de minha vida, quando
eu mergulhei no inferno do cárcere e
conheci outras experiências, outros homens. Na verdade a minha obra anterior é
bastante cerebral, feita com inteligência e vaidade; resultado de muita
leitura, repleta de artifícios, sem o sangue da realidade, sem o sangue do
rouxinol. No Retrato de Dorian Gray eu apenas olhava para mim mesmo, era o meu
retrato.
Não precisamos entrar no bar, sentamos em cadeiras distribuídas na calçada. E começamos a beber. Foi quando
chegou Lima Barreto, maltrapilho e com a
botas sujas de lama, cigarro no bico. Pediu uma dose de parati e disse como vai Oscar Wilde.
A esta altura eu já estava bêbado e resolvi ir embora. No
meu do caminho lembrei-me que tinha
esquecido a flor da lapela do poeta em cima da
nossa mesa. Voltei para pegá-la. Chegando lá encontrei a fossilizada no asfalto junto com tampinhas de cerveja. As
portas do bar já estavam fechadas.
Eu nunca acreditei muito naquela história da explosão
inicial do Universo, mas tinha o Big-Bang como um dogma científico. Sim, porque
se os ateus não creem nos dogmas religiosos, eles precisam acreditar nos dogmas
científicos, aos quais não compreendem, mas alguns cérebros mais evoluídos
endossam a crença. Algo assim como se teu cérebro tivesse uma evolução ainda
paralisada no elo perdido, a explicação que falta para compreendermos a
evolução do macaco ao homem.
Deixemos de macaquices e voltemos a explosão inicial – o Big
Bang –, cuja explosão inaugura o universo que pensamos conhecer. Ocorre que os
cálculos dos cientistas maravilhosos e suas teorias voadoras descobriram,
recentemente, que alguns quasares parecem existir desde muito antes que os
cálculos da explosão inaugural.
E, ao invés de refazerem os cálculos que parecem ser
incompatíveis e também parece não ter solução para o problema, imaginam agora
que o Big-Bang pode não ter ocorrido e o universo existiria desde sempre. Ora,
que não tenha fim nos parece ser mais fácil acreditar, até porque gostaríamos
de não morrer. Mas como não ter princípio? O universo sempre existiu? Mas esse
não era o Deus dos crentes? Não dá pra ter nem umas explosõezinhas aqui e ali
para acertar os cálculos que foram atrapalhados pelos quasares? O universo não
começou e nem termina?
Não, essa trapalhada dos cientistas não me fará mais crente,
teimoso que sou em desacreditar. Prefiro concordar com Mário Quintana que o
Tempo é uma invenção da Morte. Ele engole tudo para acabar com o que existe. E
o Universo deve conter o Tempo para não ser engolido por ele. A poesia me é mais
explicativa que a ciência ou a religião.
JOSÉ FERNANDES CARVALHO, vulgo "ZÉ DA PRATA", nasceu na localidade Prata, município de Altos-PI, no dia 1º de Junho de 1871. Violeiro, poeta, trovador e repentista e repentista de grande talento, produziu vasta obra que continha mensagens polêmicas para a sociedade de sua época, como o erotismo e críticas de cunho político. Tocava Sanfona com rara felicidade e tinha o hábito de cantar nas festas. Casou-se com Liduína Paiva, filha de João de Paiva Oliveira (o filho do fundador de Altos). Foi lavrador, funcionário da Prefeitura Municipal de Altos e escrivão da Coletoria Estadual, em Altos. Veio a falecer em 14 de março de 1945, na localidade Canto Alegre (parte integrante do atual município de Coivaras, que se desmembrou do município de Altos em 01 de janeiro de 1993). Zé da Prata não deixou obra escrita, mas seu talento é reconhecido e sua poesia permanece viva na memória popular, tendo sido transmitida às gerações posteriores através da tradição oral. (Extraído do perfil atribuído a Zé da Prata no Facebook)
Poemas publicados por Zózimo Tavares, garimpados por Durvalino Couto:
TÍTULO: Frutos Estranhos — Sobre a
inespecificidade na estética contemporânea
AUTOR: Florencia Garramuño
EDITORA: Rocco, 128 páginas
::Luíz
Horácio
Florianópolis
A pesquisadora argentina, Florencia
Garramuño, professora da Universidade San Andres, em Buenos
Aires, PhD pela Universidade de
Princeton, Estados Unidos, e pós-doutora
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), escolheu obras
artísticas do Brasil e da Argentina e
transformou em livro; Frutos estranhos, são quatro ensaios que abordam, segundo
Florencia, a arte inespecífica.
Um nome novo para algo existente, manjadíssimo para estudantes de
Comunicação e Estética.
Do que se ocupa? Investiga a imbricação das variadas formas de
expressão artística, atualmente também trata das possibilidades numa variedade
de mídias que servem de suporte. Mas o que resulta dessa imbricação, dessa
invasão do espaço alheio, que arte é essa?
Exemplo: Esquilos de Pavlov, livro de estréia da artista plástica
e a partir de então escritora, Laura Erber. Nesse trabalho a autora utiliza a
fotografia para tornar visível a narrativa. Outra utilidade para essa
combinação é de permitir um número significativo de interpretações.
Outros, como Abel Meeropol
fizeram o caminho inverso, seu
poema Strange fruit
nasceu quando o poeta viu
uma foto de linchamento de negros nos Estados Unidos. Não demorou para o
poema, nascido de uma foto, virar música e tornar-se um clássico na voz de
Billie Holiday. Ainda surgiria um romance com esse mesmo título. Logo, a
cumplicidade não é novidade. Desde que executada por artistas competentes o
resultado geralmente é expressivo embora não seja essa a tônica.
Para enfatizar a ausência de novidade na obra de Garramuño, sugiro
que o curioso leitor faça uma pesquisa sobre o termo Remediação, definido por
Paul Levinson como
um processo que faz uso de novas
tecnologias para melhorar as tecnologias
precedentes.
Enram em cenas os paladinos das novas mídias;
internet, realidade virtual e mais e mais, erguem barreiras que as separam das mídias anteriores.Elas, as novas,
oferecem novos parâmetros estéticos. Isso se não é óbvio, é o quê? Até onde sei
o novo traz novidades. Ou não?
Jay David Bolter e Richard Grusin
buscam um meio termo, acreditam que as novas mídias se justificam por
atualizar as antigas mídias, a isso chamam de Remediação.
Vá atrás, curioso leitor, da obra da dupla;Remediation. Understanding new
media, 2000, para isso existe Amazon.
Frutos estranhos faz parte da coleção Entrecríticas, e repete
o título de uma instalação de Nuno
Ramos, essa picaretagem identificadora do estágio patético das artes plásticas,
cometida no MAM, Rio de Janeiro/2010.
Diz a professora que as obras citadas nos ensaios apresentam como
ponto comum a “unidade do não pertencimento”, elas se identificariam a partir de
uma não indentificação. Demais para um tosco aprendiz como este que ora digita
essas tristes frases. Tristes porque se ocupam de um vale tudo na terra de
ninguém, tudo se justifica, tudo pode, desde que o autor saiba ostentar seus
títulos e premiações. Aí a orda ignara ajoelha e aplaude. Separar o joio do
trigo é prática pra lá de obsoleta.
Mas façamos uma tentativa.O que seria esse tal “não
pertencimento”.
Garramuño defende que, em certas obras contemporâneas brasileiras e latino-
americanas, percebe-se uma certa
indeterminação, uma dificuldade de definição dos limites entre as formas de
expressão, suportes e discurso, por parte dos artista,. Essa dificuldade ou
confusão, caso você prefira, assim como eu, implica o tal do não pertencimento. Resultado: o
inespecífico. Profundo, não! Não, um vale tudo. Isso mesmo, não há regras. E à
literatura, a nossa principalmente, que não anda bem das pernas há muito tempo,
restou o papel de coadjuvante.
E por falar em Literatura, quem está no balaio?
Pois bem, encotramos por lá títulos de Luiz Ruffato, Ricardo
Domeneck, Carlito Azevedo, Tamara Kamenszain, Sylvia Molloy. O que fizeram para
merecer isso? Excetuando Luiz Ruffato, eles eram muito cavalos, única obra de
grande relevância entre as arroladas pela autora, os demais primam pela combinação de gêneros e misturas
de ficção e realidade embora sem alcançar a ambiguidade de Philippe Forest,
Christine Angot e Jean-Louis Fournier.
Fico com esses para não ocupar mais umas dez linhas. Pois bem, alinhemos os nossos autores com os artistas
plásticos Helio Oiticica, Nuno Ramos, isso mesmo caro leitor, você precisa
gostar pois todo mundo gosta. Mesmo que para
isso seja necessário não entender nada sobre pintura, escultura, ah, mas
precisa entender de instalação!
Mas atenção, apressado leitor, existe um detalhe extremamente
importante em Frutos estranhos, e ele reside no subtítulo; Sobre a
inespecificidade na estética contemporânea, algo como uma auto defesa. A
ocorrência e utilização das novas mídias, a propagação das redes sociais, o
leitor, um novo leitor ou o velho leitor forçosamente adaptado?, o leitor como
cúmplice criador. Resumo utilizando palavras adequadas: Os antigos suportes,
uma tela antigamente servia à pintura, um mosaico era destinado a um
revestimento, decoração; atualmente podem, respectivamente, receber uma
projeção em vídeo e um poema. Logo, os suportes ganharam outras utilidades e
até mesmo novos sentidos. A interatividade é quase uma exigência, a obra, seja
ela literária, temos livros onde o leitor está encarregado de concluí-lo; seja
uma instalação onde a presença, a movimentação do espectador, agora
coadjuvante, passa a dar sentido. Isso mesmo, estupefato
leitor,inespecificidade na estética contemporânea.
Também podemos interpretar
essa inespecificidade como estágio de um aprendizado, como usar as novas
tecnologias de modo a produzir arte relevante. Combinar ingredientes é arte
para poucos, e não podemos deixar de reverenciarmos a arte que se mantém
através de séculos.E sem a mudança de suportes. Diga, honroso leitor, o que
torna Bach atual, Cervantes, o que torna Rabelais um moderno? Este aprendiz não
sataniza as novas mídias, mas há que saber utilizá-las, do contrário não passa
e não passará de uma expressão confusa, e por vezes bastante barulhenta, da
falta de talento.
Deixo aqui uma sugestão de
obra onde você encontrará um tanto dessa inespecificidade, da combinação de
novas e não tão novas mídias, um trabalho primoroso envolvendo literatura,
artes gráficas, música, a intervenção do artista/criador, capaz de mudar o rumo
da história. Para isso um detalhe que
viaja através dos tempos sem envelhecer se faz notar; talento. Melhor,
talentos. Vale a pena, está em
concepção direção e textos do professor da UFSC,
poeta, romancista, Alckmar Santos;vídeos e músicas do também professor da
Univ.Mackenzie Wilton Azevedo
Afinal de contas Frutos estranhos é um livro de crítica literária,
de artes plásticas, de antropologia, é o quê? Não é nada, se pensarmos nisso ou
naquilo, ao mesmo tempo representa uma diversidade imensa de
possibilidades.Para isso basta dizermos o seguinte: é um livro de criticas sobre as novas formas
de expressão artística. Mas voltemos um pouco no tempo. Alguém há de lembrar de
Glauber com a câmera na mão registrando o velório de Di Cavalcanti. Era arte? É
arte?
Deixo uma questão: quem escreverá um ensaio sobre o pau de selfie?
Mas pau de selfie é arte, produz arte? Jamais subestime nossa
mediocridade, inocente leitor.
TRECHO
Na análise do trabalho da artista Roni Horn, inspirado em Água
viva, de Clarice Lispector - cujo pertencimento a um gênero ou forma é evitado
constantemente - , Hélène Cixous explorou os vários modos como a artista
deslocou as frases da escritora para azulejos de borracha colocados no chão de
uma galeria, ou escritas em serigrafia que depois penduraria nas escadas e
corredores do espaço. Segundo Cixous, Horn expôs “toutes les façons possibles
de fuir un cadre, un enfermement, une arrestation donc une Maison, un cage, une institution, une
frontière, un tout. La désappartenance.”[ todas as maneiras de fugir de um
quadro, de um encerramento, de uma captura e logo de uma casa, de uma gaiola,
uma instituição, uma fronteira, um todo. O não pertencimento.] ( 2005, p.62)
Désappartenance ou disbelonging, em inglês, conservam um sentido
mais ativo que negativo que eu gostaria de manter para essas práticas; um modo
que, mais que exibir uma carência, faz da invenção do comum e desindividualizante uma proposta ativa para
imaginar mundos alternativos,que talvez a palavra impertinência permita sugerir
com mais felicidade.
AUTORA
Florencia Garramuño é PhD em Romance, Languages and Literatures
pela Princeton University e pós-doutorada pela UERJ. Dirige o Programa em
Cultura Brasileira da Universidad de San Andrés, na Argentina e é pesquisadora
independente do CONICET
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Luiz Horácio destrói os Frutos Estranhos da argentina. Mas ele chama atenção como é interessante o original de Abel Meeropol na voz de Billie Holliday. Para a lembrança do belo original: