domingo, 28 de junho de 2015

Macunaíma e a "tão falada" homossexualidade

(Edmar Oliveira)
Mário de Andrade 

Na semana passada um frenesi tomou conta do meio intelectual curioso brasileiro. Por força da justiça, seria revelada, de próprio punho, a homossexualidade de Mario de Andrade. Uma carta dirigida a Manuel Bandeira seria revelada na íntegra. Bandeira quando publicou a correspondência entre os dois, censurou os tópicos que seriam, agora, tornados públicos.

O poeta será o homenageado da FLIP este ano. Também romancista, ensaísta, crítico literário, musicólogo e folclorista, foi um dos nossos grandes escritores, também um dos responsáveis pela Semana de 22 que promove o Modernismo no Brasil. Talvez seu feito mais notável tenha sido suas viagens ao norte e nordeste, tendo sido um descobridor da cultura nativa de sua terra. De sua primeira viagem ao norte em 1927 nasceu Macunaíma, o maior representante da raça, o nosso herói sem caráter. Da segunda viagem ao nordeste descobre o coco, esse irreverente ritmo de emboladas e improvisos; o candomblé e o nosso caboco Jurema (mistura de rituais indígenas e africanos) como manifestações fora-da-lei para as autoridades da época. Em 1938, trabalhando para o Departamento Cultural de São Paulo, organiza uma expedição para o registro das danças e cantigas do folclore, que considerava que iriam acabar, “agora que o Brasil principia”. Mário achava que o Movimento Modernista tinha que entender as manifestações culturais desse grande país. São Paulo iluminado pela cultura europeia enviesava o movimento cultural do qual tinha participado.

O Caderno Prosa & Verso do Globo traz uma edição especial em que refaz parte da viagem daquela expedição de 1938 e encontra com representantes dos movimentos documentados. Vale a pena um exame no link  http://oglobo.globo.com/cultura/livros/missao-mario-de-andrade-uma-viagem-pela-cultura-popular-inspirada-nas-pesquisas-do-escritor-16495442.

Quando a revelação esperada, um trecho da carta secreta dialoga com o leitor e com sua curiosidade. Mário não está falando apenas para o destinatário da carta, mas para todos os leitores curiosos: “Mas em que podia ajuntar em grandeza ou melhoria para nós ambos, pra você, ou para mim, comentarmos ou eu elucidar você sobre minha tão falada (pelos outros) homossexualidade? Em nada”. Descobrir que o desafeto “X” na correspondência era o Oswald de Andrade, todo mundo já sabia e a revelação não traz nenhuma surpresa. Surpresa talvez seja a descoberta da Europa por Oswald e a descoberta do Brasil pelo Mário. Os dois são brilhantes no que fizeram, apesar de desafetos.

Lembro-me de um biografo de Torquato Neto me perguntando sobre a homossexualidade do poeta, com a determinação de quem precisa de uma prova para sua tese. Disse-lhe que não me ocupava com a vida privada de ninguém. Certo que os homens públicos devem nas suas biografias algumas respostas. Mas em que a sexualidade seria tão importante para ser provada? Publiquem-se os rumores como rumores que são. “Mas em podia ajuntar em grandeza ou melhoria” etc. etc. como diz o poeta Mário na carta? Quando li a “biografia” do poeta não reconheci o meu amigo nas suas páginas. Melhor ficar com minhas lembranças. Certamente são os atributos culturais e artísticos do biografado o que mais interessa ao leitor. Quando se desvia o caminho para a vida privada, no caso de Torquato até para chegar a uma figura famosa, na intenção de promover o produto, aí o defeito é do biógrafo.  







2 comentários:

Anônimo disse...


Que bom que o Piauinauta voltou, estava fazendo falta. Quanto ao texto sobre o Mario de Andrade, tinha lido esses dias, faço minhas as suas palavras, acrescentando um comentário até vulgar, mas fazer o quê, é o que me vem, tamanha a irritação; um cara genial, com uma obra que só com Macunaíma, já não precisava fazer mais nada, já acrescentou muito. Na minha adolescência foi impactante e ainda hoje é, tão moderno e à frente esse homem conseguiu ser, o nós aqui preocupados com quantos buracos ele deu, sinceramente...

Lelê

José Pedro Araújo disse...

Feliz retorno, amigo!
Com um tiro certeiro como o seu, fico a imaginar o que estão conjeturando os beócios que ignoram a obra e se fixam no autor. Devem está cuidando do ferimento grave no coração, espero. Que pasmaceira! Publique mais!